sábado, 5 de janeiro de 2013

O Essencial é Invisível aos Olhos


Outro dia, estava eu na aula de Educação Nutricional onde nosso professor havia pedido que lêssemos “O Pequeno Príncipe” para discutirmos a obra diante da nossa profissão. Confesso que não havia lido para a aula, pois já tinha feito isso algumas vezes (já que acho este livro fantástico!). No decorrer da conversa e notando o quanto estava sendo interessante o debate do livro e sua aplicação na nossa área, me dei conta de que este seria o assunto desse meu texto, e cá estou!

Tomei o livro em mãos e comecei a ler novamente (e, como todo mundo que já leu esse livro, cada leitura é uma redescoberta de coisas simples e incríveis). Confesso que essa releitura me reafirmou o que havíamos discutido em aula: como um pequeno clássico, de leitura tão simples, pode ser uma forte ferramenta para se trabalhar o outro. E se tratando de Nutrição - essa arte de lidar com o individual - algumas passagens foram de grande aprendizado para mim e se destacaram como uma chave para uma boa atuação profissional.

O autor do livro trabalha de forma simples a importância de saber ouvir, assim como a importância de questionar. Na nossa área, a saúde, as coisas andam se tornando tão automáticas, que basta trocar um olhar com alguns profissionais e eles já estão dando o diagnóstico, as causas prováveis e o tratamento. Perdeu-se o hábito de ouvir, o hábito de conversar, de tentar entender o porquê de cada coisinha. E às vezes a resposta está justamente ali, no “por trás” de certas ações; assim como o bêbado, personagem do livro que bebia por vergonha de beber. Quantas vezes iremos nos deparar com pessoas que estão ali buscando nosso auxílio para tratar uma fraqueza que nem sempre tem explicações fisiológicas. E vem daí a lição do Principezinho de se interessar pelo outro, de buscar a essência e não o superficial, de ser menos mecânico e mais humano.

Na obra, o autor divide sua experiência frustrada de tentar desenhar o que sua imaginação percebia e ser desmotivado pelos “adultos” que não conseguiam enxergar com a mesma clareza. Afirma, então, ter abandonado uma esplêndida carreira de pintor para se aventurar em outra área. E quantas vezes nós, profissionais de saúde, profissionais da nutrição, desmotivamos alguém, por uma simples palavra mal colocada, por uma simples expressão facial ou pura e simplesmente por não compreender o que aquela pessoa quer nos mostrar. Reafirmo aqui o que sempre digo sobre a profissão que escolhi: a nutrição é uma via de mão dupla, não depende apenas de um dos lados dessa parceria! Encorajar o outro, buscar o que ele traz no seu íntimo e não sabe expor da maneira que esperamos, motivá-lo a encontrar o seu melhor, é nosso papel e o caminho para o sucesso que esperamos obter nessa relação.

Assim como o personagem contador e os “adultos” se apegam em números o tempo todo, nos deparamos com os “quantos quilos tenho que perder?”, “quanto tempo vai levar?”, “quero pesar tanto!”, “tenho que comer tanto!”... Vários números que mecanizam um aprendizado que vai além de “quantas calorias esse alimento tem?”

Outro personagem, o acendedor de lampiões, ilustra bem uma realidade dos “tempos modernos”. Estamos vivendo em um mundo onde executar vale mais que pensar, que questionar. Apenas executamos as ordens (dadas por outros ou por nós mesmos) e não paramos um segundo sequer para entender o que nos rodeia ou o porquê daquilo. Temos, ainda, muito do vaidoso em nós. Queremos ser admirados o tempo todo. Mas muitas vezes essa admiração se torna tão superficial que o mais importante passa despercebido. E tudo isso para alcançar padrões impostos por “alguém aí”.

Pois bem! Levemos em consideração as lições dadas pelo rei e pela raposa. O primeiro faz uma importante colocação sobre a relação com o próximo: devemos exigir de cada um, o que cada um pode nos dar. Não é porque estamos ali representando uma “autoridade”, como nutricionistas, que devemos cobrar do outro aquilo que ele não tem condições de alcançar. Já a raposa, vista como um animal traiçoeiro por muitos, nos ensina o poder de colocar emoção em tudo. Precisamos colocar emoção no que fazemos e fazer com paixão, e devemos mexer com o sentimento do outro para despertar nele o seu melhor.

Fica também a maior das lições, no meu ponto de vista, que esse clássico da literatura nos deixa, não apenas na nossa profissão, não apenas na nossa área, não apenas na historinha contada pelo livro, mas lição para a vida toda: precisamos sempre buscar o melhor do próximo, enxergar o melhor que ele tem através da superficialidade que a vida impõe, pois “O ESSENCIAL É INVISÍVEL AOS OLHOS”!

* Aos que já leram a obra, recomendo que leiam novamente, com outros olhos, com outra perspectiva, sempre que julgar necessário. Aos que ainda não leram, espero ter despertado a vontade de abrir logo este livro por aí. “O Pequeno Príncipe”, escrito por Antoine de Saint-Exupéry, é uma obra antiga, de leitura simples e singela que vem atravessando gerações com suas lições. Acrescentaria ainda ser um livro surpreendente, pois, quem diria que um clássico “infantil” pudesse se tornar para nós uma verdadeira apostila de Educação Nutricional?

                                                                                       Tamara Pereira
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terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Prato do dia: O tempo

Como disse Antônio Prata em uma de suas crônicas: “O bem mais valioso de nossa época não é o diamante nem o petróleo ou a fórmula da Coca-cola (...)”, o bem mais precioso de que temos hoje é o tempo.

O tempo é a definição da própria vida, a nossa vida é dividida por horas, minutos, segundos, dia, mês e ano. Se não soubermos lidar com ele da melhor forma possível, ele pode acabar se tornando um vilão.Em uma palestra que assisti recentemente, vi que existem estudos sobre o ato de reservar um tempo e se sentar a mesa para comer, e como esse pequeno ato pode trazer consequências muito positivas, tais como: menor propensão ao estresse, ansiedade, transtornos alimentares entre outros problemas.  Além disso, para as crianças a presença dos pais na hora do almoço e/ou jantar é fundamental para transmitir bons hábitos, que poderão ser seguidos por toda a vida.

O tempo, ou a falta dele, exige que as pessoas façam escolhas movidas por esse fator. É mais fácil comer um lanche com batatas fritas no almoço, que em 10 segundos esta na sua mão e em 5 minutos no seu estomago do que preparar a própria comida, por exemplo. Desse modo, o alimento é simplesmente engolido entre um gole e outro de refrigerante, não se sente o gosto da comida e o que era pra ser um momento de “relaxamento” no dia, se torna apenas mais uma obrigação.Buscando o significado sociológico da refeição, tem-se que o ato está contido na possibilidade de pessoas que não partilham interesses específicos se encontrarem para uma refeição em comum.

Ter que comer é uma necessidade muito primitiva e inevitavelmente comum a cada indivíduo. É isto justamente que possibilita a reunião das pessoas para compartilhar uma refeição e, nesse ritual ampliar o tempo de convivência entre os familiares e amigos, possibilitando maior conhecimento mútuo e troca de experiências e assim, permitir a superação do simples ato de comer, uma vez que esse momento vai muito além de apenas ingerir substancias nutritivas.
Pensando na realidade de hoje, aonde cada um da família chega a casa num horário diferente, devido a seus compromissos com o trabalho, escola, projetos e etc., a refeição, um momento tão importante, acaba ficando de lado, completamente esquecida. É importante que, ainda que não todos os dias, que esse momento seja estabelecido pelo menos uma ou duas vezes na semana. E o legal disso tudo, é que quando esse compromisso é marcado, com todos juntos e com a comida preparada em casa, as chances de a refeição ser mais saudável aumentam.

É importante que isso seja refletido, até que ponto o tempo esta tomando conta das nossas vidas?  Reservar algumas horinhas do dia pra nós mesmos é essencial, e que isso ocorra sem que a sensação de inutilidade logo nos assombre, como se precisássemos estar sempre produzindo, produzindo, numa sequencia infinita. Afinal, enquanto não descobrimos a cura para este mal, a única saída é tentar controlarmos o nosso tempo, e não o contrario. 

Beatriz Crepaldi Smidt
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segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Do “alimente-se” ao “alimentar-se”



Já me peguei algumas vezes pensando na dificuldade de vestir a camisa da Nutrição, ou como diria um professor que tive, ‘comprar a ideia da Nutrição’. É, porque a tarefa é sim bastante difícil! Por quantas e quantas vezes a gente se encontra no papel de ouvinte da seguinte frase “Mas e você, você come tudo isso mesmo?” ou “Nossa, mas você segue isso direitinho?” e confesso que na maioria das vezes em que me encontro nessa situação minha resposta (mesmo que não expressada) vem a ser um “Não, não faço!”.  

Desde então, comecei a me questionar e percebi que entre dizer “Alimente-se bem! Alimente-se assim (...)” e o ato de “alimentar-se bem, alimentar-se assim (...)” existe uma estrada quilométrica. Estrada essa onde algumas placas devem ser muito bem observadas e algumas curvas respeitadas, para que, além de se chegar ao destino proposto, as barreiras ultrapassadas se tornem menos penosas. E pensando nisso eu cheguei a três acentuadas curvas dessa estrada que devemos considerar quando falamos de mudar hábitos: CONHECIMENTO, INFORMAÇÃO e RESPEITO.

Conhecer é preciso! Ter o conhecimento necessário para disseminar a arte da Nutrição faz parte dessa estrada o tempo todo. E não só conhecer sobre o ato e os efeitos de nutrir. Falo de um conhecimento multidisciplinar, envolvendo aspectos físicos, psicológicos, econômicos, históricos, culturais e sociais. Conhecimento que permita observar, discutir e transmitir todas as facetas da Nutrição. E esse conhecimento deve ser repassado (ou melhor, multiplicado!) de forma clara e eficaz por todos os meios possíveis, de uma simples conversa em um almoço em família a um grande Congresso Internacional.

Com isso a gente chega à próxima curva, a da informação! Uma informação que deve ser simples, completa e dinâmica. Várias vezes nós (nutricionistas em construção) recebemos informações contraditórias e/ou errôneas, que nos confundem e nos fazem questionar diversos assuntos. E que bom! Que bom que podemos questionar, esclarecer as dúvidas, debater e formar opinião. Mas se pensarmos em milhares de pessoas que recebem várias informações sobre o “comer bem” de forma incompleta, vazia ou superficial, veremos a importância de “formar para informar”.

Ok! Passamos pela curva do conhecimento, da informação e paramos na mais acentuada entre elas, a do respeito. A arte de nutrir caminha lado a lado com a sabedoria de saber respeitar! Para fazer essa ponte entre o “alimente-se!” e o “alimentar-se” o respeito ao outro é um forte pilar de sustentação. Respeitar a busca do próximo, que vê em nós, Profissionais da Nutrição, muitas vezes, uma solução para seus conflitos e um espelho de seus objetivos. Respeitar o próximo como um ser sábio e cheio de conhecimentos que curso ou Universidade nenhuma irão nos transmitir. Respeitar os hábitos do outro, observando sua cultura, suas preferências, suas aversões, sua história, sua rotina. É respeitando que se ganha respeito e a Nutrição é uma linda via de mão dupla onde o sucesso do outro é nosso sucesso!

Pensando assim e observando esses, e outros aspectos, percebi que quando se espera construir uma rotina alimentar saudável, criar novos hábitos, e “comprar a ideia da nutrição” é preciso se esforçar para transitar nessa estrada cheia de obstáculos. Entre dizer ao outro, e a nós mesmos, “alimente-se bem!” e o ato de “alimentar-se bem”, temos um árduo, e satisfatório, trabalho que deve fazer de nós profissionais mais humanos que técnicos; mais sensíveis que práticos; mais amigos que “doutores”.

Tamara Pereira.
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segunda-feira, 12 de novembro de 2012

"Superinteressante" ou, nem tanto!



Pensando no que ia escrever, depois de um final de período um tanto turbulento, voltei pra casa dos meus pais. Minha mãe é dona de uma banca de jornal e revistas e sempre que volto ela me mostra praticamente todas as revistas que saíram alguma reportagem sobre saúde, a dieta da moda, receitas ou politicas relacionadas.

Dessa vez cheguei e me deparei com uma Superinteressante que na capa vinha escrito “A Ciência da Dieta” e o subtítulo ainda completava, “Chocolate pode emagrecer. Adoçante pode engordar. Batata frita vicia tanto quanto drogas. Conheça as novas descobertas que estão revolucionando o mundo das dietas.” Frente a tantas afirmações lá fui eu ler a revista pra ver do que se tratava.

O que eu encontrei?! Essas informações que comumente encontramos em revistas de saúde, alguns exemplos: alimentos como pimenta, canela e gengibre são termogênicos e “aceleram” a “queima” de gordura, que chocolate pode ser um aliado da saúde, que o cérebro funciona de forma que comer te causa prazer e pessoas que apresentam resistência à ação de determinados hormônios provavelmente leva a pessoa a comer mais e por ai vai.

A notícia me incomodou, e muito, devido a forma como eles apresentaram as ditas “vantagens e desvantagens” de cada alimento ou combinação, ou seja, de maneira extremamente apelativa. Fiquei pensando no que essas revistas são capazes de fazer pra vender mais exemplares. Milhões de maneiras de emagrecer com prazos cada vez mais curtos, alimentos milagrosos, promessas sem fundamento algum, ignorando total e completamente a saúde. São corpos tão perfeitos, mais tão perfeitos, que não são reais! É bem difícil, pra não dizer impossível, encontrar uma capa que não tem um trabalho de alguém que sabe muito sobre photoshop.

O pior?! Já perdi as contas de quantas vezes vi pessoas passando pela banca, vendo/comprando essas revistas com uma autoestima baixíssima, se lamentando por não conseguir seguir determinada dieta/regra/rotina que a noticia impõe ou por não ter o padrão de beleza que é estampada em todas essas capas.

Nunca esqueci uma coisa que ouvi uma vez de um professor que destacava o quanto somos escravos da nossa própria geração, ele dizia que essa geração vive a “Ditadura do Ótimo”, um ótimo corpo, uma ótima alimentação, uma faculdade ótima, um emprego ótimo, tudo da melhor qualidade. Menos, que ótimo não vale! Se você não se enquadrar nisso tudo você está perdido. Será?! Vez ou outra me pego pensando nisso!

Gabi Carvalho
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terça-feira, 6 de novembro de 2012

O que tem a ver a fome, Eduardo Galeano e os Guarani- Kaiowás?


FOME,

·         Na Gramática: Substantivo feminino com quatro letras, sendo duas vogais e duas consoantes;
·         Na Matemática: Arranjo de quatro elementos, que possibilitam 24 anagramas.
·         Na Fisiologia: Inata, não seletiva, necessidade de fonte de energia para o crescimento, desenvolvimento e manutenção da vida.


Hoje é minha estreia no blog, e como toda(o) iniciante, fiquei pensando em milhares de temas que poderia abordar na minha primeira contribuição.  Então, pensei em compartilhar uma das minhas mais recentes e queridas ocupações, o Livro dos Abraços, de Eduardo Galeano.

Escolhi carinhosamente o texto:

 “A fome/2: Um sistema de desvinculo: Boi sozinho se lambe melhor... O próximo, o outro, não é seu irmão, nem seu amante. O outro é um competidor, um inimigo, um obstáculo a ser vencido ou uma coisa a ser usada. O sistema, que não dá de comer, tampouco dá de amar: condena muitos à fome de pão e muitos mais à fome de abraços”.

Atualmente coloca-se em voga a questão do genocídio indígena no Brasil, destacado principalmente pela representação dos Guarani-Kaiowás, tribo situada no município de Iguatemi, Mato Grosso do Sul.  Há muito tempo os índios sofrem com sucessivas investidas que partem dos (des)mandos de grandes empresários ruralistas. Essa situação crônica de afronta aos direitos humanos é advinda da falta da demarcação de terras e do crescimento desenfreado e inescrupuloso do agronegócio nas terras do Pantanal (como em diversas terras espalhadas pelo solo verde e amarelo). Tudo começou em 1770, quando se desencadeou um processo genocida com uma verdadeira política de remoção dos Guarani-Kaiowá de seu território de origem. Muito por  parte dos (agro)empresários na incessantemente busca da expansão de seus territórios (lucros) bem respaldados por um governo conivente.   Após sucessivos ataques, o que pode-se perceber foi uma redução considerável das terras para que os índios habitavam, o que para os Guarani-Kaiowá representou uma redução da própria possibilidade de existência, culminando num alto índice de suicídios (principalmente entre os jovens).

A cerca de um mês, a visibilidade da questão indígena tomou grandes proporções, principalmente na mídia alternativa (redes sociais), após a declaração da carta dos Guarani-Kaiowás ao povo brasileiro, onde expuseram que se fossem retirados de suas terras como uma liminar da justiça federal colocava, todos prefeririam cometer um suicídio coletivo, para que em suas terras ficassem marcadas por sangue, o fim de suas vidas. A demarcação das terras indígenas é uma solicitação pautada há tempos, uma vez que diferentemente do simbolismo que as terras tem para os ruralistas (pedaços/espaços de mercadorias), os índios enxergam nas mesmas suas (sobre) vidas propriamente ditas, agredindo assim, seu teko arandu – modo sábio de viver.

E o que tem haver a fome com isso? TUDO. Seguindo a lógica do texto de Galeano, vivemos uma realidade dotada de muitas contradições, paradoxos e fomes. A questão indígena representa sim um cenário relacionado ao sentido majoritário que conhecemos da fome, até por que segundo relatórios da Suvival International em parceria com a ONU em 2006, a fome, problemas de saúde e de depressão estão se espalhando entre os índios, os caracterizando-os como comunidades com forte prevalência de insegurança alimentar no país, mesmo que paradoxalmente dividam cena com a (falsa) ideia de que o agronegócio seria a solução para combater a mesma (vide Revolução Verde). Porém, a fome que coloco em questão é a fome que Galeano brilhantemente detecta quando finda seu texto, a fome de amor ao próximo!

Pensar na segurança alimentar dos índios (que inclui o direito à vida, às terras, o acesso ao alimento, condições de habitação,...) é simplesmente um desdobramento, quando se pensa na busca da erradicação da fome de altruísmo que temos instalada em nossa sociedade. Muitas(os) poderiam se perguntar, então, como sanar essa fome. E eu mesma responderia que não sei, e nem acredito que devemos nos prender a isso. O central de voltarmos nossos olhares a esse tipo de fome é simplesmente o primeiro passo: problematizar a questão. Rotineiramente, assim como as opressões, a coisificação das relações humanas e o desejo incessante de se sobrepor a(o) outra(o) vem se naturalizando e se cristalizando. E é onde a disposição, o desejo de mudar, e principalmente, a crença na mudança surgem como fatores essenciais para o inicio do processo propriamente dito.

Dessa forma, gostaria de deixar essa reflexão à todas(os), agregada de uma convite, para que não nos bastemos com a solidariedade, mas nos levantemos contra essa e outras diversas fomes, buscando uma superação a partir de saídas individuais (buscando o altruísmo em nossas ações) e coletivas, a partir do pensamento e ações em conjunto.

"Somos o que fazemos, mas somos, principalmente, o que fazemos para mudar o que somos." (Eduardo Galeano)

Sophia Rosa
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quinta-feira, 1 de novembro de 2012

“Faça do teu alimento, o teu remédio.”


Há algumas semanas atrás tive que fazer uma pesquisa sobre Quefir pra uma disciplina da faculdade. O quefir é um grão originário do Cáucaso, uma região que fica entre a Ásia e a Europa. É um alimento cada vez mais estudado/consumido, por ser um probiótico. Alimento probiótico é aquele  alimento que tem na sua composição microrganismos que promovem benéficos a saúde.

No desenrolar dessa pesquisa li um texto que começava com a seguinte citação, “Faça do teu alimento, o teu remédio.” Já tinha ouvido essa frase, mas nunca havia dado a devida atenção. Segundo fontes não muito seguras, essa frase foi dita a mais de 2 mil anos atrás e é de autoria de Hipócrates, um filosofo grego tido como  “O pai da medicina”. Pra mim, essa relação de alimento e remédio é na verdade um pouco nebulosa, uma vez que nunca associei remédio como algo bom e prazeroso. Muitíssimo diferente da forma como eu enxergo os alimentos e o processo de alimentação. Me parece algo muito coerente, pois, já está mais que comprovado o poder dos alimentos na manutenção e recuperação de um bom estado de saúde/vida.

Mas fiquei pensando, não na frase de Hipócrates, mas no fato de que, nós nos alimentamos varias vezes ao dia, todo dia. E nos alimentamos, olha só, de alimentos! Mas será que quando essa frase foi dita, o cara que a “assinou” estava falando do mesmo alimento que nós comemos hoje, todos os dias?

Ai que tá, bioquimicamente, talvez sim. Mas como nossas relações não são equacionados bioquimicamente, o que nós comemos não é exatamente o mesmo alimento que Hipócrates se referia a 2 mil anos. Faça um simples exercício mental, tente se lembrar dos alimentos que você tem no seu armário e na sua geladeira. Se não se lembra vá até eles e dê uma breve olhada. Percebeu o tanto de plástico envolta dos alimentos?! Esse plástico é uma tecnologia desenvolvida, 1) para conservar por mais tempo os alimentos e 2) para criar uma segunda imagem do alimento, que dependendo da perspectiva pode ser visto como um “produto”.

Em algum momento da história nos “des”envolvemos de tal forma que foi preciso criar tecnologias para conservar os alimentos por mais, e cada vez mais, tempo. Mais especificamente quando começamos a nos organizar como “sociedade industrial”, lá por volta de 1750 (d.c).

A embalagem é uma dessas tecnologias que nos ajudam, mas que também nos afetam, sobretudo na questão ambiental, quando não damos o destino correto às mesmas. Porém existem outros elementos, além das embalagens, e esses intrinsecamente ligados aos alimentos, que são os conservantes químicos, os acidulantes, os aromatizantes, os corantes e etc. Na sua maioria, aditivos artificiais, ou seja, que não se encontram naturalmente na composição química dos alimentos, e estão sendo adicionados com o propósito de conserva-los e atribuir sabores que remetem aos alimentos no seu estado natural.

Muita gente já torce o nariz para os alimentos industrializados, embutidos, com excesso de açúcar, sal, porque sabe que de alguma forma eles trazem algum prejuízo pra saúde. Existem pesquisas sendo divulgadas, exaustivamente, que relacionam o consumo excessivo desses alimentos às recentes epidemias de obesidade, diabetes, hipertensão arterial e uma diversidade de câncer (de boca, estômago, esôfago e intestino). E quando se pergunta para as pessoas o porquê, mesmo sendo elas conscientes dos prejuízos, elas continuam a consumir esses alimentos, uma resposta é quase unânime: “Por falta de tempo!”, “Por conta da correria do dia-a-dia”. E aqui, nessas respostas é quero chamar a atenção pra uma questão muito simples, e que nessa tal “correria do dia-a-dia” acaba nos tirando o foco.

Em que momento da vida moderna, nós, seres (teoricamente) pensantes, deixamos que a nossa alimentação diária fosse substituída pelos lixos, VAZIOS, em termos de vitaminas, minerais, gorduras “boas” e proteínas de alto valor biológico, o qual damos o nome de Alimentos Industrializados? Sobretudo nós brasileiros que temos a disposição uma imensa biodiversidade e um clima perfeito à produção de uma infinidade de alimentos altamente nutritivos, e com potencial enorme de promover a saúde da população?

Falo aqui, especificamente da questão alimentar, mas a crítica é ampla e nasce basicamente de uma rápida análise dessa lógica produtivista a qual temos nos organizado. Já parou pra pensar no tamanho da falta de respeito que cometemos na forma como lidamos com nossos corpos todos os dias?

Não me parece lógico, que as nossas atividades básicas, como o estudo e o trabalho, tomem tanto o nosso tempo, de modo que não possamos tirar algumas horinhas pra preparar e apreciar, de fato, o que levamos para o nosso prato. É certo que a questão é um pouco mais ampla, perpassa também a discussão de políticas públicas voltadas à Soberania Alimentar e a Produção de Alimentos. Mas algumas atitudes são nossas. Submeter-se a trabalhos, empreitadas, metas e projetos que sugam nosso tempo, de modo que outras esferas da vida sejam relevadas totalmente a segundo plano, não teremos outro resultado senão esse a que temos assistido: pessoas deprimidas, epidemias de doenças comportamentais, câncer e mais uma série de prejuízos para a nossa saúde. E nesse caso, temo em dizer, que no longo prazo, a simples formulazinha do nosso amigo Hipócrates, não vai servir de nada.

Alison Douglas
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quarta-feira, 24 de outubro de 2012

O Peso de Grandes Expectativas


Para começar meu primeiro texto no blog, fiquei pensando em diversos temas, mas decidi falar um pouco sobre o nosso corpo. E não apenas o corpo, mas como lidamos com ele e de que forma ele interfere em outros aspectos do dia a dia.

A sociedade hoje em dia, cada vez mais valoriza a magreza e o corpo extremamente malhado e perfeito, transformando a gordura cada vez mais, em uma espécie de símbolo de falência moral. O nosso corpo nada mais é que a nossa identidade pessoal, e sendo assim, sentir vergonha do próprio corpo seria equivalente a sentir vergonha de si mesmo.

Existe atualmente certa cobrança pela felicidade, essa dada como uma obrigação, um dever de que o ser humano deve ser constantemente feliz, sociável e que exale felicidade e otimismo o tempo todo. A relação com a materialidade corporal também entra com bastante importância nesse aspecto, uma vez que a obsessão pelas boas formas físicas e, ainda, a ânsia por encarnar na própria pele a perfeição, acaba por punir o homem e cobra-lo de uma perfeição que na verdade não existe.

Do ponto de vista mais sociológico, o estigma que sofremos com a perfeição constante pode ser tão ou mais prejudicial que inúmeros problemas de saúde. A beleza física e o corpo, muitas vezes são distorcidos, sendo como se sua identidade estivesse reduzida àquilo.

A organização mundial de Saúde define saúde como: um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doenças ou enfermidades. Logo, é possível compreender que estar saudável, ou no sentido mais amplo disso tudo, estar feliz, não se resume apenas a uma imagem que é passada aos outros. Afinal, quando estamos bem consigo mesmo, isso reflete pelos poros, pela pele e pelo olhar.

Temos que impedir que o corpo se transforme em mercadoria de consumo, como muitas vezes somos influenciados com revistas, filmes, novelas e a mídia em geral. A nossa relação com o mundo externo e interno tem de ser harmônica, e isso é muito importante principalmente para nós da nutrição, pois muito além de prescrição de dietas temos em mãos o ser humano, e toda sua complexidade, que com certeza não se reduz aos quilinhos a mais.

"Cada um ali vive intensamente sua vida, lhe dá um peso que equivale à imagem que fazem de si e as suas expectativas sobre os outros. Cada um ali se defronta com a leveza quando se despem disso...”

(A insustentável leveza do Ser; Milan Kundera).

Beatriz Crepaldi Smidt
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